Um dia desses, assisti a um noticiário
nacional em que se falava sobre a Cura Gay, e me imaginei na oportunidade de um
dia conversar com o deputado Marcos
Feliciano. Fui dormir pensando nessa possibilidade e acabei sonhando com ele.
Tivemos um diálogo que mais perecia um monólogo, só eu falava, e ele, passivo,
ouvia-me.
- Vossa Excelência acha mesmo que
homossexualismo é uma doença?
- Fosse o homossexualismo uma doença, quem
a trataria?
- O SUS, Vossa Excelência? O SUS ofereceria
tratamento psicológico aos supostos doentes.
- Uma sessão a cada ano bissexto, né? Porque se as sessões são reduzidíssimas no
sistema privado de saúde, imagine, Vossa Excelência, no SUS, como seria.
- Vossa Excelência, fale uma coisa para
mim. No atendimento aos “supostos doentes”, haveria classificação de risco?
Seria como, Vossa Excelência? Imagino um
enfermeiro classificando o risco:
- Olhe, você tem prioridade. Você está
muito gay.
- Olhe a sua roupa.
- Olhe só! Você está vestido como o filho
do Fábio Júnior.
-Isso seria ridículo.
- Não cabe nada no SUS, não cabe ninguém no
SUS, Vossa Excelência.
- Vossa Excelência não sabe como é o SUS e
não tem sensibilidade.
- Vossa Excelência se diz cristão, não é?
- Considera-se, então, um representante de
Cristo.
- Cristo proporia a Cura Gay, Vossa
Excelência?
- Cristo curava doentes propriamente ditos,
não criava doenças.
- Os cristãos propriamente ditos
envergonham-se de Vossa Excelência, que não tem noção de que o país de fato
precisa.
- Vossa Excelência não conhece o SUS.
Trabalhar em hospital em condições
precárias é, às vezes, brincar de Deus, disse certo dia um enfermeiro numa
dessas conversas que se tem em botequins. Afirmou que, quando o número de
leitos de UTI é menor do que o de pacientes gravíssimos, o médico escolhe quem
morre e quem talvez sobreviva. Poucas coisas são mais tristes do que brincar de
Deus.
Poucas coisas são mais ultrajantes do que
chamar de doente a quem, optante ou não optante, tem uma postura sexual
diferente da maioria. Os “doentes”, como denomina Marcos Feliciano e sua
seguidores, são majoritariamente educados(as), competentes e politizados(as);
para sorte do equivocado deputado, não são violentos.
- Vossa Excelência parece ser bastante
atuante e, como bom cristão, deseja o bem; deseja a cura.
- Fico imaginando quais serão as próximas
curas, Vossa Excelência.
·
Cura para pastores que se aproveitam da fé
alheia?
·
Cura para as feridas provocadas pelos dólares na
cueca?
·
Cura para a picada do Caso Sanguessuga, a máfia
das ambulâncias?
Na semana passada, o Brasil assistiu estarrecido à morte de Bryan,
menino boliviano cruelmente assassinado em São Paulo. O secretário de segurança
decretou prioridade máxima e os suspeitos foram rapidamente presos. Bryan
morreu, isso é muito triste; seus assassinos estão presos, isso é muito bom. Mas
onde estão os políticos do Caso Sanguessuga, a máfia das ambulâncias? Quantos pacientes
deixaram de ser atendidos? Quantos morreram?
Onde estão os ex-deputados Ronivon Santiago e Carlos Rodrigues,
principais integrantes do desvio de dinheiro público destinado à compra de
ambulâncias?
- Por que não se preocupa com essa doença chamada corrupção?
- Mas Vossa Excelência é muito importante para a história do Brasil,
Marcos Feliciano. Sua posição frente ao homossexualismo é um dos absurdos que
leva o povo brasileiro à rua; nossa Primavera
Tupiniquim está só começando. O gigante ainda está espreguiçando,
erguendo-se, conscientizando-se do seu tamanho, para lutar contra você, uma
doença legislativa.
Meu sonho acabou quando fui despertado pela TV, que exibia
Marcos Feliciano tentando se defender do que é irrefutável.
Márcio Bastos
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